terça-feira, agosto 15, 2006

EU NÃO SEI FALAR JAPONÊS

PARTE 1

O táxi disponível fazia parte do esqueminha.


Alexandre Moreira Leite

Eu não sei falar japonês, foi o que eu disse quando me informaram que, por falta de vagas, a equipe da Globo ficaria em hotéis separados no meu primeiro ano de cobertura do Grande Prêmio do Japão de Fórmula 1. Eu estava em pânico e não era para menos. Quando visitei o país pela primeira vez, alguns anos antes, tive problemas de comunicação. Mesmo em Tóquio. Na ocasião, para vocês terem uma idéia, eu pedi a um funcionário do hotel uma sugestão de restaurante barato (uma contradição, se tratando de Japão) e... Bem, para encurtar a história, paguei uma conta de cento e cinqüenta dólares na indicação dele.

Mas, voltando à história inicial, descobri que, além de ficar em hotéis diferentes, ficaríamos também em cidades diferentes. A minha seria Tsu, vizinha a Suzuka. Eu não sei falar japonês, repeti com mais ênfase. Cláudio Amaral, companheiro de várias aventuras e durante muitos anos o cara que montava sozinho a cabine de transmissão da Globo na Fórmula 1, me tranqüilizou. “Relaxa, todo mundo da equipe já passou por isso. Temos um esqueminha que não falha e você vai chegar sem problema ao hotel e depois ao circuito”.

O Claudinho foi explicando e eu anotando para não perder nenhum detalhe. “Primeiro você vai desembarcar em Nagoya”, disse ele. “No próprio aeroporto, você vai pegar um trem que te levará direto a Tsu. Não tem erro. A estação é bem sinalizada e você não vai ter dificuldade de comprar a passagem, Depois de mais ou menos duas horas de viagem, você vai sair da estação e encontrar uma grande avenida. Siga por ela e entre na primeira à direita. O seu hotel é o terceiro prédio do lado esquerdo.”

E continuou. “No dia seguinte, é só fazer o caminho inverso para chegar na estação. O pessoal de lá entende um pouco de inglês. Compre uma passagem para Suzuka. A viagem é rápida. Menos de vinte minutos. Saindo da estação em Suzuka, você vai dar numa praça. Lá vai ter uma fila. Entre nela. É a fila do táxi. Quando chegar na sua vez, não precisa abrir a porta. Ela abre sozinha. Depois que você entrar no táxi, o motorista vai lhe perguntar alguma coisa. Você responde : Suzuka Circuitô. Ele vai fazer uma nova pergunta. E você diz: Padocô., que é assim que eles falam padock.” Eu escutava tudo incrédulo, achando que ele estava tirando sarro da minha cara.
“Ah”, continuou ele. “Quando você chegar, diga: recitô. E ele vai lhe entregar o recibo da corrida. Não tem erro. Funcionou comigo”.

Ainda estava atônito, dias depois, no vôo para o Japão. Mas, pensei com os meus botões, não custava nada tentar. Apesar de achar que a história toda parecia um trote, eu não tinha nada a perder. Não tive nenhuma dificuldade de pegar o trem e quase duas horas depois estava desembarcando em Tsu. E, para minha surpresa, o hotel ficava exatamente onde o Claudinho me disse. Mas a história do táxi me preocupava. Ninguém pode ser tão cartesiano assim.

(continua amanhã, quarta-feira)