quinta-feira, novembro 09, 2006

DISFARCE

Hermann Nass

Em 1979, eu tentava desesperadamente escapar do exército. Além de trabalhar, cursava jornalismo na Escola de Comunicação da UFRJ, a saudosa ECO. Como não tinha pistolão, fui enviado de quartel em quartel, numa longa peregrinação de quase um ano, até passar pela PE e pela unidade do CPOR. Odiava os militares, lutava pelo fim do regime autoritário e era a favor da liberdade de expressão.

Caí nas graças dos milicos. Acho que perceberam uma excelente oportunidade de ter um espião infiltrado no campus da Praia Vermelha, lugar de efervescência do movimento estudantil. Sei que todos os demais "candidatos" a soldado tiveram seus cabelos cortados e experimentaram fardas e capacetes, enquanto eu permaneci numa sala separada até a chegada de um educado oficial.

"Vamos te dar um grande presente", disse. "Você não vai ter que cortar esse cabelo comprido nem vai usar farda ou capacete. Aliás, você não vai servir no quartel. Quero que volte para sua faculdade e estude. De vez em quando você vem aqui e conta prá gente o que seus colegas estão fazendo fora da sala de aula."

Só faltava essa. Eu, um militante de esquerda, transformado em alcagüete disfarçado de estudante. Fiquei revoltado e gritei um sonoro "não vou fazer isso!" para o militar. Acho que minha ousadia deu resultado. Duas semanas depois, recebi uma carta do exército: estava liberado por excesso de contingente! Voltei para a ECO. Sem disfarce.

2 Comments:

  • Caraca, você nunca tinha contado isso, Ananás.

    Fernando

    By Anonymous Anônimo, at 2:13 PM  

  • Caro Molica, tinha coisa que a gente nem gostava de lembrar. Outra: sabe aqueles textos mimeografados que circulavam de mão em mão no ME, pregando as doutrinas marxista-leninista-trotzkista-comunista-socialista....?
    Pois é, sobraram alguns para meus alafarrábios porque estavam escondidos dentro de uma caixa acústica velha.
    Bons tempos...
    Ananáss

    By Anonymous Anônimo, at 3:53 PM  

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