Um editorial aqui, outro ali. Os grandes conglomerados nacionais da comunicação intensificam seus pitacos, seus lobbies, a favor de uma revisão da carcomida regulamentação do setor. O que vem aparecendo na mídia é apenas o gelo derretido na ponta do iceberg. Há uma guerra rolando nos bastidores, uma guerra onde vale tudo, uma guerra pela gigantesca fatia da indústria do entretenimento. A batalha tecnológica pela adoção do sistema de TV digital, a ser implantado a partir do ano que vem - promete-se transmissões em HDTV para a cidade de São Paulo em junho -, tenta camuflar a questão política, cultural e democrática, esta sim muito mais importante. Na verdade, a adoção do sistema japonês (devidamente adaptado às necessidades brasileiras - leia-se da Rede Globo) deixa ainda aberta a discussão sobre como vai ser fatiada a banda, quem vai ter acesso a ela, que parte será destinada à comunicação pública, sem falar nas questões paralelas, como convergência das mídias, rádios e TVs comunitárias, financiamento público deste circo etc.
Este aparente emaranhado de interesses tende a ficar no plano do lobby das corporações caso a sociedade civil, organizada ou não, permita que a discussão fique restrita à definição de atribuições e regulamentação do uso da TV Digital. O que está claro para todos é que o Código Brasileiro de Radiodifusão, de 1962, já não contempla ninguém e nada. Foi naturalmente superado pela tecnologia e pela evolução do mercado. No entanto, não há interesse nenhum de quem detém as concessões de democratizar a discussão. Em encontro recentes com executivos de uma grande emissora de televisão, um dirigente disse com todas as letras: "Não podemos deixar a definição da tecnologia e da regulamentação da TV Digital para amadores. Fazer qualquer concessão é perder mercado. Isso não podemos tolerar." Claro, que interesse público que nada. Ele está ali fazendo o papel dele. Defender a corporação que lhe paga régios salários e participações. Então a pergunta:
- Quem vai defender o interesse público?
A resposta é simples: o público. E o público somos nós. Organizados em ONGs, sindicatos, associações de classe, pequenas empresas produtoras de conteúdo. Se deixarmos, será o Helio Costa, representante dos conglomerados no Governo, quem vai determinar as direções.
Será que é coincidência apenas a campanha aberta pelos grandes órgãos da imprensa contra a presença das ONGs no Governo? Será que é coincidência a pressão pela não continuidade de Gilberto Gil no Ministério da Cultura? Tudo parte dos mesmos grupos de pressão que inviabilizaram a implantação da Ancinav - Agência Nacional do Cinema e do Audiovisual - com o argumento de que "queriam tolher a liberdade de expressão". São estes mesmos grupos que comandam, com o braço da Anatel e da Polícia Federal, a perseguição às rádios comunitárias. Que pretendem inviabilizar, no bojo da regulamentação da TV Digital, as tevês comunitárias.
Eles querem sempre mais, mais do mesmo.
Antonio Basílio