sábado, setembro 09, 2006
SUAVE É A NOITE
A rigor, o Léo não deveria estar nesta foto, para melhor traduzir o que foi meu papo com a musa da Bossa Nova, Astrud Gilberto. Quis o destino que o primeiro livro biográfico que me ocupei na minha fase novayorquina de estudos e equipagem, fosse justamente o de Stan Getz, com quem Astrud foi casada.
O livro revela um fato interessante e eu aproveitei para saber se era também verdadeiro: depois de dias de ensaio do grupo brasileiro para a lendária apresentação no Carniege Hall, em 61, quando Astrud apenas emprestava a voz nos ensaios, Stan descobriu que ela não entraria no palco na grande noite. Intrigado, o saxofonista perguntou: “Mas ela não vai cantar com a gente por qual razão?”. E ouviu uma resposta machista de João Gilberto: “Ela apenas nos ajuda nos ensaios, pois é bem afinada”. Stan ficou petrificado e, após o estrondoso sucesso da temporada americana, conversou sério com Astrud que, aparentemente, esperava que alguém percebesse o que estava acontecendo.
A partir desta conversa com Stan, ela começou uma carreira internacional e, no mesmo momento, os dois casaram, é claro! No dia desta foto, numa festa em Manhattan, 1997, Astrud confirmou a versão do biógrafo: “Foi bem assim que tudo aconteceu”.
(Agora, se o Léo não tinha nada que estar na foto, feita na casa da produtora Siomara, imagine os dois no canto esquerdo: de frente, Jorge Pontual, repórter da Globo News, e de costas, o então Ministro da Cultura, Luiz Roberto Nascimento e Silva.)
(Da série Meus arquivos implacáveis)
sexta-feira, setembro 08, 2006
quinta-feira, setembro 07, 2006
CV REVISITADO
Lá vem Caetano de novo. Não como Lula, nunca vem nos braços do povo. O baiano tornado carioca, por opção e marketing, apaulistado, poeta-luz de uma geração, está de volta em bolacha e frases polêmicas.
- Não voto em Lula. Destesto me sentir um imbecil. - dispara nas páginas de O Globo.
Respeitemos a escolha, com certeza refletida e sentida. Mas não há razão para engoli-la feito suco de graviola, que desce macio e conforta. Pelo contrário. Caetano sabe que diz essas coisas para provocar. Está no seu gene baiano, leonino. E ruge a fera:
- Temos que estar atentos para que o segundo mandato de Lula possa mesmo ser melhor do que o primeiro. Não que tenha sido um mandato péssimo. Foi medíocre como o de Fernando Henrique, o que é muito bom para nós. Vão ser 16 anos da esquerda marxista da USP.
Calma, segura as patas do rei dos animais. Estaremos atentos sim, Caetano. Sempre estivemos. Talvez você, neste período de globalização do repertório, que agora parece página virada, tenha perdido um pouco o pé da história local. Sua ex-mulher e sempre empresária não perdeu. Vale a pena reavivar a memória.
No Governo passado, a empresa da ex-Sra. Veloso foi abastada de verbas federais para diversas iniciativas. FHC patrocinou os anos dourados de Natasha. Nos meios artísticos todo mundo comentava os favorecimentos e a autoridade com que a Sra.Lavigne circulava pelos gabinetes. Essa coisa mudou no Governo Lula. Sob sonoros protestos das cabeças coroadas da cultura nacional, a despeito dos gritos e gemidos produzidos nas festas que reuniam a república baiana e o capital paulista, investiu-se os parcos - bem mais parcos do que se desejava - recursos do erário em projetos de baixo custo, espalhados pelo território nacional, promovendo, silenciosa e parcimoniosamente, a democratização da produção cultural. Se fez filme no Acre, teatro no Mato Grosso, programa de televisão no Piauí. Por causa dessa política, Caetano, se insurgiram contra o Governo os Barretos, os Montenegros, os Ubaldos. Essa gente que, por talento reconhecido, sempre achou estar dois degraus acima da plebe ignara, cujo papel era lhe dever vassalagem e verbas públicas.
Incomoda a todos nós o ainda não totalmente explicado envolvimento de figuras do PT nos escândalos de corrupção. O PT deve explicações, punições e certamente pagará em votos o custo de sua negligência. Aliás, postura não muito diferente da adotada pelo PSDB nos escândalos do Governo FHC. Há no entanto, duas diferenças básicas. Por mais que os escândalos se perpetuem na nossa história política, neste Governo eles realmente vieram à tona com força e ceifaram cabeças de governantes. Nunca se investigou tanto, nunca se acusou e prendeu tanto. No Governo passado, tudo foi varrido para baixo do tapete. Neste Governo, a vida do povo melhorou sensivelmente. Muita gente saiu da miséria. O que não aconteceu no segundo mandato FHC. No primeiro, o volume de matéria fecal em que estávamos metidos era tão grande que uma lufada de ar foi suficiente para reeleger o Príncipe.
Então, mano Caetano, menos retórica e mais música. Menos lamento e mais talento. Menos louvação e mais aplicação. É o que pedem os tempos.
Saudemos pois o retorno de Caetano Veloso à musicalidade nacional, ao experimentalismo, às suas origens criativas - juntar o velho e o novo para daí tirar a seiva musical que nos sacia.
Antonio Basílio
LEMINSKI EM PROSA
O escritor catarinense Jayro Schmidt lança dia 20, em Florianópolis, o livro Paulo Leminski: Do carvão da vida o diamante do signo. São ensaios literários enfocando diferentes aspectos da obra de Leminski, que também será tema de palestra do jornalista Toninho Vaz, autor da biografia O Bandido que sabia Latim (Ed. Record). Toninho também escreve o prefácio do livro de Jayro, uma iniciativa da Bernúncia Editora. Vai ser dentro da programação do 1º. Festival de Final de Inverno, na Universidade de Santa Catarina, às 19 horas, com apresentação da banda Jeremias sem cão. Todos convocados.
quarta-feira, setembro 06, 2006
TERRITÓRIO DE GIGANTES
Foi a crônica da morte anunciada. Phelps Dodge, a grande mineradora americana, desistiu de comprar a canadense Inco, gigante do níquel, abrindo caminho para a Vale do Rio Doce (na foto, a assistente de câmera Sylvia durante filmagem da MIDMIX na mina de cobre de Sossego, no Pará). Enquanto a brasileira tinha o dinheiro prontinho para deixar todo mundo satisfeito, mesmo os acionistas mais céticos, a proposta da mineradora americana não conseguia agradar nem à velhinha de Kentucky, uma de suas acionistas minoritárias.
A transação entre Vale e Inco ainda deve levar semanas, numa costura que vai movimentar a ponte aérea entre Brasil e Canadá. A Vale trabalha a todo vapor na implantação sua primeira jazida de níquel, nas proximidades de Canaã dos Carajás, no Pará. Trata-se de uma região pobre, que carece de alternativas econômicas, após a passagem dos ciclos de desmatamento, exploração madeireira, agricultura e pecuária extensiva. Com a aquisição da Inco, a empresa também passa automaticamente a ser uma das gigantes do níquel, sua mais nova área de atuação.
ENCONTRO DAS ARTES
A noite foi de muitas histórias. O grupo reuniu editor, designer, jornalista, fotógrafo, cineasta, escritor ... Na foto, clicada por Roberto Rosa, Tereza Baumgarten, da Editora Versal, o fotógrafo Américo Vermelho, a designer Karin Mathuy e o escriba desta nota. Todo o grupo esteve envolvido, de alguma forma, na criação e consolidação de uma imagem corporativa para a Odebrecht, a gigante brasileira na construção pesada. Empresa pioneira na globalização das atividades, há décadas presta serviços em países tão distintos como Chile e Angola, Estados Unidos e Portugal. Como coordenador de comunicação da Odebrecht na década de 90, minha atribuição era reconstruir a imagem da empresa, envolvida em terríveis escândalos de corrupção. Eram outras épocas. Porém, os mesmos costumes ainda persistem no país. Muda governo, muda partido, ficam os mesmos problemas. A Odebrecht resolveu fazer diferente, fazer o que é correto, e está aí: mais forte que nunca, ajudando a construir e reconstruir Angola (por duas vezes estive em Angola a trabalho, ambas em plena guerra civil que teimava em se perpetuar) por mais de vinte anos. Mesmo nos piores momentos.
Foram muitas histórias naquela noite de festa. Dali, já de madrugada, dei uma carona para Américo Vermelho e quase vimos o dia clarear num banco da Praça São Salvador, tomando a última no único trailer que continuava aberto. Por nossa causa, óbvio. Minha mulher ficou brava de tanta preocupação, coitada! Morar no Rio gera certas paranóias. Bons tempos quando era possível curar a bebedeira num banco de praça. Mesmo assim, foi uma noite brilhante.
terça-feira, setembro 05, 2006
SOS NA COLINA
O interior do Hotel dos Descasados, que era assim, no maderame, ficou como se vê abaixo.
Flagrantes de uma destruição: quem vai pagar pela depredação do patrimônio?
Toninho Vaz
Os responsáveis pela obra, um grupo francês de hotelaria, afirma que a restauração está sendo observada criteriosamente, mas a realidade é outra: quase tudo foi já demolido, inclusive a escada de madeira de acesso ao quartos de cima. Estas fotos e as denúncias foram encaminhadas a diversos jornais do Rio, mas nenhum mostrou interesse em publicar uma segunda opinião – mesmo sendo da entidade representativa dos moradores. O lobby francês é forte (eles conseguiram cooptar Alfredo Brito, outrora preservacionista), mas vai sofrer agora uma série de ações judiciais contestatórias. Adulterar e depredar o patrimônio histórico é crime federal. Mentir é pecado nada original. E para a imprensa? Bola preta, diria Ibraim. Agora, uma pergunta indiscreta: de qual lado vocês acham que o Tanure está?
Para vocês terem uma idéia da importância do casarão, vale dizer que logo no início das obras, os técnicos encontraram nos subterrâneos da construção uma senzala, documento original do Brasil colonial.
segunda-feira, setembro 04, 2006
VICE-VERSA
Bastou o noticiário mundano anunciar que “arraia ataca e mata caçador de crocodilos australiano”, para o especialista Marcelo Szpilman, do Instituto Ecológico Aqualung, colocar os pingos nos is:
“Arraias não atacam ninguém. As espécies potencialmente perigosas possuem em sua cauda um aguilhão que pode inocular uma potente peçonha. Ao ser perturbada ou estressada, a raia costuma dar violentas "chicotadas" com sua cauda. Nesse momento, seu aguilhão adquire uma posição perpendicular à cauda e, ao atingir sua vítima, provoca ferimentos profundos e graves com inoculação de peçonha. Mas, veja bem, elas precisam ser molestadas e ameaçadas pois são, por natureza, totalmente inofensivas e incapazes de atacar quem quer que seja.”
Então, a manchete correta seria:
“Caçador ataca arraia e sofre as conseqüências.”
IMAGEM DA JANELA 4
Em noite de lua minguante, quase lua nova, uma luz mágica revela uma estátua vigilante na noite carioca, mesmo quando a imagem fica meio embaçada após nova tragédia urbana.
Meninos e meninas do Rio, jovens cariocas! Curtam a vida, divirtam-se nas madrugadas, mas preservem suas próprias vidas! Deixem o carro na garagem se forem beber ou curtir uma onda, uma balada ... Mantenham-se vivos! Quem fica é que chora.
CONFUSÃO
Esta placa de trânsito causou certa dúvida à equipe do blog que tentava estacionar a van no centro de Ouro Preto, semana passada, durante as filmagens de mais um vídeo para a MIDMIX, a produtora carioca. As placas de trânsito, aliás, são das poucas coisas que sujam a bela cidade mineira, cujas ruas estão limpas e bem conservadas. Os turistas prestigiam e comparecem em massa. Belo exemplo.
LUDO-LUDO IRREAL
Toninho Vaz, de Santa Teresa
O dia amanheceu fechado e chuvoso, como se as trevas indicassem o caminho que devo seguir agora pela manhã: Cemitério São João Batista. São 9 horas. Estou indo para o enterro de um dos jovens mortos no acidente de carro, na madrugada de ontem, na Lagoa. Durante a tarde, na casa dos pais do garoto (18 anos), meus amigos de Copacabana, testemunhei cenas pungente de desespero em estado bruto. Estou em choque há 24 horas. Não sou religioso e nem pacifista, exatamente, mas gostaria de abusar da minha enorme fé para propor aos jovens impetuosos que se acalmem, no bom sentido. Para isso, nada melhor do que celebrar a vida. Meninos e meninas, pais e mães, proponho que todos nós, nesta segunda-feira (e forever) façamos uma trégua ao espírito, pensando mais em si (no caso dos jovens, “olhando para dentro”) e no mundo que nos cerca. Exercício gramatical correlato deve ser feito em torno da palavra Harmonia, em toda a sua etimologia, inclusive psicológica e para-psicológica. De resto, colocada a cabeça no lugar, resolvidas as ansiedades básicas, vale tudo, até beijar homem com homem e mulher com mulher. Podem começar!
domingo, setembro 03, 2006
MEMÓRIA ANALÓGICA
O chef era o competente Larry Baeder, guitarrista nascido no Texas, que traz no currículo as bandas de Bud Guy e Joni Mitchel. Ele prepara dois tipos de costela, uma delas, deliciosa, coberta com mel.
Stu, que não é músico, tem uma espetacular coleção de violões, ocupando um dos quartos da casa, com 26 exemplares e suas respectivas histórias.
(Foto, 1997)
O OLHAR
Sou casado com uma fotógrafa. Meu pai adora fotografia e desde pequeno me vi fascinado por todo tipo de imagem parada. Ainda lembro de, pequeno, na casa de minha avó paterna em Ipanema, ficar parado horas folheando velhos álbuns de família. Aquelas imagens assentaram na retina e se fizeram memória. Escorreram pelo peito e, no coração, moldaram o afeto.
As revistas, hoje ítens esquecidos em consultório de dentista, tiveram seu papel. Mal sabia ler e adorava aquelas fotos estouradas de Manchete e O Cruzeiro.
Minha primeira máquina ganhei, de verdade, aos 14 anos. Meu pai me deu uma antiga Hasselblad, meio formato, em que nada era automático, tudo manual.
- Com essa você vai aprender a fotografar. - ele disse.
E eu aprendi. Apanhei, mas aprendi. A fotometrar a luz, escolher enquadramento. Algum tempo depois, ganhei tardes no laboratório da escola, mexendo nas químicas, me embebedando com os odores do processo de revelação.
Primeiro foi a paixão pelo preto e branco. Pela crueza dos contrastes, pela suavidade do cinza. Pelas moças que se arriscavam nesta arte, tão sensíveis, tão calorosas. Depois, vieram as cores e os experimentalismos psicodélicos.
A educação do olhar é fundamental. Pouco se fala sobre isso hoje. Parecemos viciados em olhares preparados por outros, olhares manufaturados, eletrônicos, pré-pagos. Vejo meus filhos e sofro. São tantos apelos visuais que o olhar tonteia. E me pergunto: distinguir, decifrar, desnudar o olhar são exercícios de uma outra época? Como educar o olhar para acreditar no belo, no instinto, no desejo, em meio a tanta mentira e impunidade? Na civilização dos óculos escuros e da câmera digital, a imagem se proliferou feito vírus. Está em tudo e em nenhuma parte. Todo mundo pega e ninguém sabe (nem quer saber) porquê. Mais uma ou menos uma, tanto faz.
- Viva o olhar desarmado! Liberdade para a cegueira voluntária!
Antonio Basílio (texto e foto)